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Pesquisa na UFF comprova a desigualdade de rendimentos entre homens e mulheres no Brasil

Muitas e inegáveis são as diferenças entre homens e mulheres, desde as anatômicas até as comportamentais. Mas uma diferença, em especial, chama a atenção, num momento em que no Brasil e no mundo se fortalece o movimento feminista e, com ele, as conquistas de direitos negados historicamente. Trata-se das desigualdades de renda entre homens e mulheres, que vêm deixando, cada vez mais, de serem percebidas como “naturais” e absolutas. Esse tema vem sendo objeto de estudo das pesquisadoras Lucilene Morandi e Hildete Pereira de Melo, que coordenam o Núcleo de Pesquisa em Gênero e Economia (NPGE) da Faculdade de Economia da UFF.

Voltado para estudos relativos à história dos feminismos, mercado de trabalho, distribuição de renda, trabalho não remunerado, entre outros, o Núcleo atualmente possui como um dos seus principais eixos de pesquisa a investigação acerca do Produto Interno Bruto (PIB) per capita na ótica de gênero. Para as professoras, “a perspectiva de gênero no estudo das relações socioeconômicas constitui uma forma mais consistente de analisar os papéis exercidos pelas mulheres e homens na sociedade, apreendendo as desigualdades e analisando, como um de seus componentes centrais, a assimetria de poder”.

Por PIB compreende-se a soma dos valores referentes a bens e serviços produzidos por determinada região, durante certo período. Trata-se do mais importante indicador aplicado em análises socioeconômicas com o intuito de avaliar níveis de desenvolvimento. Já a terminologia “per capita” indica uma média por pessoa de determinado valor. Nesse sentido, o intuito da pesquisa é o de desenvolver uma investigação sobre a riqueza produzida ao longo de determinado período levando em conta os rendimentos do trabalho de homens e mulheres, em território nacional.

Segundo Lucilene, o estudo sobre PIB per capita na ótica de gênero possui como um de seus principais objetivos apresentar como a renda per capita está desigualmente distribuída entre homens e mulheres e como esta desigualdade persiste ao longo do tempo. De acordo com a professora, este é um projeto inovador, não disponível nas estatísticas oficiais, nas quais os dados de rendimento por sexo referem-se apenas ao rendimento médio do trabalho principal, não incluindo outros, de natureza complementar. A ideia é que projetos como esse possam avançar no aprofundamento das relações de gênero, que constituem “o fio condutor utilizado para trafegar entre os cânones estabelecidos pela macroeconomia”, enfatiza.

“As mulheres ainda são minoria em todas as instâncias de poder e de decisão, tanto públicas quanto privadas, e têm rendimentos menores que o dos homens […]”, Hildete de Melo.

Apesar do aumento da participação feminina no mercado de trabalho nos últimos vinte e cinco anos, período pesquisado no estudo, Lucilene aponta o quanto se manteve quase inalterada durante esse tempo uma diferença de renda entre homens e mulheres, em prejuízo delas. Segundo ela, “mesmo com o aumento do nível de educação das mulheres (superior ao dos homens no período analisado), da maior participação no mercado de trabalho e do crescimento do rendimento feminino neste período, a renda das mulheres continua a ser menor que a dos homens”. Em outras palavras, “os avanços sociais das mulheres no campo educacional e do trabalho não foram suficientes para construir a igualdade de rendimentos entre os sexos”, destaca.

Hildete de Melo complementa dizendo que “as mulheres ainda são minoria em todas as instâncias de poder e de decisão, tanto públicas quanto privadas, e têm rendimentos menores que o dos homens mesmo quando ocupam cargos e têm qualificação semelhante ao dos homens, apesar de toda evolução econômica, social e política no Brasil e no mundo”. De acordo com a professora, essa desigualdade de rendimentos entre os sexos tem relação, sobretudo, com a invisibilidade do trabalho da mulher, com a desqualificação da atividade doméstica, que constitui o tipo mais comum de trabalho não pago.

Para ela, “o ocultamento das tarefas domésticas nas estatísticas oficiais de produção e consumo na sociedade, como algo que foge ao escopo da teoria econômica, porque não é objeto de troca/venda na sociedade, foi tratado pelo pensamento feminista como a construção da imagem partida da mulher, de cidadã de segunda categoria. Estas tarefas mantêm uma íntima relação com a situação de inferioridade da mulher no mundo atual”, explica.

Em outras palavras, os estudos da teoria econômica, ao não contabilizarem o trabalho feminino no interior das famílias, por não possuir um valor econômico e não ser atravessado por trocas monetárias, subestima as atividades realizadas pelas mulheres e suas contribuições ao bem-estar econômico. Uma pesquisa como essa do PIB per capita na ótica de gênero, portanto, “evidencia que a plena participação das mulheres pode ser visualizada através da eliminação das limitações que as marginalizam ou as tornam invisíveis, seja nas atividades domésticas, seja nas atividades públicas e produtivas”, afirma Hildete.

Para além da não aceitação do velho estereótipo do papel feminino e do desmascaramento do trabalho não pago, outra importante conclusão do estudo aponta para como essas desigualdades poderiam vir a ser equilibradas em um cenário futuro. Segundo as professoras, isso dependeria, em parte, da proposição de políticas públicas voltadas para as mulheres, como, por exemplo, o aumento da oferta de creches e escolas de ensino fundamental de tempo integral. Dessa forma, seria possível, conclui Lucilene, “uma maior liberdade de decisão sobre sua vida profissional”.

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