Laboratório de Óptica e Informação Quântica da UFF desenvolve trabalho de ponta com reconhecimento internacional

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“Não é fácil ser pioneiro no Brasil atuando em uma ciência tão eurocêntrica como a Física”. A frase é de autoria do professor do Instituto de Física da UFF (IF) Antonio Zelaquett Khoury, fundador e coordenador do Laboratório de Óptica e Informação Quântica da universidade. Khoury foi recentemente eleito membro da OPTICA, anteriormente conhecida como Optical Society of America, cujo objetivo é o de promover o avanço da pesquisa científica e reunir a comunidade internacional de investigadores da área de Ótica.  

Há mais de duas décadas, e a despeito de todas as dificuldades inerentes a quem escolhe como caminho profissional a pesquisa no Brasil, o pesquisador da UFF vem desenvolvendo um trabalho de excelência e internacionalmente reconhecido no laboratório, com uma equipe de alunos por ele formada, além de um quadro docente permanente, constituído pelos doutores Carlos Eduardo Rodrigues de Souza, Daniel Schneider Tasca e Gabriel Bié Alves. As pesquisas giram em torno dos fundamentos da mecânica quântica, da física aplicada e da informação quântica, através da chamada “luz espacialmente estruturada” e suas propriedades. Uma vez compreendidos e manipulados, esses recursos podem ter múltiplas aplicações, como criptografia de alta segurança, computação quântica, processamentos de imagens, entre outras coisas.

Khoury destaca que, quando entrou na Universidade, havia muito pouca infraestrutura para a pesquisa na área de ótica quântica e que, inicialmente, a única opção disponível era a de colaborar com outros grupos maiores, a fim de se manter uma produção científica regular. Nesses grupos, no entanto, o trabalho de sua equipe assumia um papel coadjuvante. Mas já em 2006, começou a se desenvolver no laboratório um estudo independente e pioneiro, que veio a mudar o curso dos acontecimentos. “Naquela época, tivemos a ideia de conectar os conceitos de informação quântica com os processos de estruturação de um feixe de luz e, no ano seguinte, publicamos um primeiro artigo sobre o tema na Physical Review Letters, uma das revistas mais importantes da área de Física”.

Segundo o pesquisador, outras pesquisas foram produzidas no laboratório desde então e, aos poucos, veio a repercussão internacional. “No começo, houve reações positivas e negativas, mas, com o tempo, a ideia foi se impondo por si só, como é comum no desenvolvimento da ciência. Nossas contribuições foram reconhecidas por vários físicos sêniores de outros países, entre eles, a professora Elisabeth Giacobino, ex-secretária de Ciência e Tecnologia da França, o professor Joseph Eberly, ex-presidente da Optical Society of America e o professor Luiz Davidovich, atual Presidente da Academia Brasileira de Ciências”, comemora. 

Para compreender um pouco dos estudos produzidos no laboratório e de seu pioneirismo, é preciso entender o significado de um conceito-chave, que perpassa toda a trajetória de investigações da equipe: a chamada luz estruturada. De acordo com Khoury, a melhor forma de assimilar esse conceito é estabelecendo um paralelo com a genética na biologia. “A genética estuda como a molécula de DNA, que é um componente fundamental da vida, é constituída, de forma a determinar as características de um ser vivo. Alterando a sequência de aminoácidos no DNA, podemos ‘programar’ os atributos de um ser humano adulto, como altura, cor dos olhos etc. Da mesma forma, os fótons são os componentes fundamentais de um feixe luminoso, que também possui atributos próprios, como cor e direção de propagação”.

Além desses atributos da luz, existem outros menos conhecidos pelas pessoas não especializadas na área, e que são de grande importância para as telecomunicações e microscopia, por exemplo. O docente explica que, atualmente, “é possível controlar esses atributos fotônicos, de maneira a programar as características de um sinal luminoso utilizado para a transmissão de informação ou para a iluminação de objetos microscópicos. Isso é o que fazemos no Laboratório de Óptica Quântica do Instituto de Física da UFF”.

Khoury esclarece que muitos dos conceitos utilizados nos métodos de estruturação da luz foram inspirados em princípios da informação quântica e que essa é a base das contribuições pioneiras dadas pela pesquisa desenvolvida no laboratório. “Nós conectamos dois temas de pesquisa aparentemente independentes, o que serviu de inspiração para o desenvolvimento de novas técnicas na área de Ótica. O prêmio que recebemos é o reconhecimento internacional das nossas contribuições ao tema”, destaca.

Muitas dessas pesquisas desenvolvidas no laboratório têm contado com contribuições significativas de docentes teóricos, a exemplo do professor do Instituto de Física Kaled Dechoum. Segundo ele, “ultimamente a equipe tem investido bastante no estudo de luz espacialmente estruturada no sentido de codificar mais informações. As possibilidades tecnológicas decorrentes destes estudos são enormes, já que a luz deverá substituir os elétrons em vários dispositivos, tornando-os mais miniaturizados e mais precisos. Ao se investigar esses fundamentos, enfim, temos uma melhor compreensão da realidade do mundo e da própria natureza da luz, até se chegar a sugerir usos tecnológicos”, enfatiza.

Além dos docentes, outra parte fundamental de todo o trabalho desenvolvido tem sido estruturado através dos alunos. Para Khoury, inclusive, eles são a essência do laboratório, pois constituem a força motora da pesquisa científica. “Certamente, o reconhecimento que temos hoje tem a contribuição de todos os estudantes que passaram por aqui. Vários deles conseguiram posições de pós-doutorado no exterior, com financiamento estrangeiro, o que é um sinal significativo de visibilidade internacional da nossa pesquisa. A maior parte dos ex-alunos do laboratório hoje trabalha em instituições de ensino e/ou pesquisa”.

Entre esse time de peso, está José Augusto Oliveira Huguenin, atualmente docente do Instituto de Ciências Exatas da UFF no campus de Volta Redonda, onde foi pioneiro na montagem do Laboratório de Óptica, por ele coordenado. Khoury ressalta que o trabalho desenvolvido pelo ex-aluno representa um importante exemplo de interiorização da pesquisa no Estado do Rio de Janeiro.

José Augusto conta que há 22 anos começou a fazer iniciação científica com o professor Antonio Khoury. Naquela época, ele narra, estava sendo iniciada a montagem do Laboratório de Ótica e Informação Quântica. “Iniciei o trabalho no laboratório sob sua orientação em um momento de extremo otimismo, e pude ver seu envolvimento na construção do mesmo: sua paixão pela pesquisa me contagiou! Lembro do trabalho que tivemos para colocar a mesa óptica no espaço e a chegada do primeiro laser de largura de linha estreita: era a máquina mais valiosa do laboratório!”, relembra. 

Seis anos depois desse primeiro encontro, em 2006, José Augusto foi aprovado no concurso público para a Escola de Engenharia Industrial Metalúrgica de Volta Redonda da UFF. Em pouco tempo, ele inaugurou uma linha de pesquisa aplicada em metrologia óptica. “Nunca deixei de manter uma colaboração com o Laboratório de Óptica Quântica da UFF. Para montar um em Volta Redonda, peguei algumas doações do IF, como bancadas antigas que já não eram utilizadas. Além disso, participei de projetos de grande porte, o que viabilizou a compra de equipamentos para iniciar a pesquisa em óptica e informação quântica em Volta Redonda. Nascia, então, o Laboratório de Óptica de Volta Redonda”.  

Outro colaborador do laboratório é o doutor em física formado pela UFF Wagner Tavares Buono, que ressalta o quanto a informação quântica está “em alta” em pesquisas da área em todo o mundo. “Muitos países hoje em dia falam em informação quântica. E uma das melhores maneiras de que se tem notícia de transmiti-la é usando feixes laser. Os feixes laser ‘espirais’ que nós estudamos já tiveram uma propriedade importante cientificamente comprovada: a da possibilidade de alta transmissão de informação. Num aspecto mais fundamental, esse estudo mostra novas maneiras de como a luz interage com a matéria. Mais especificamente, nós mostramos um acoplamento de graus de liberdade da luz”.

Braian Pinheiro da Silva, com doutorado recém-defendido no Instituto de Física da UFF, e também integrante do laboratório, aponta que as habilidades desenvolvidas por ele no estudo desse universo renderam muitas conquistas. Entre elas, um convite especial do professor Tom Vettenburg, da University of Dundee, na Escócia. “Ele me contratou para realizar um pós-doutorado em seu laboratório de microscopia computacional em conjunto com a School of Life Sciences. Um dos nossos objetivos é aplicar a luz estruturada para estudar o desenvolvimento embrionário com maior precisão”, celebra.

Diante de tantas conquistas e, independentemente do árduo caminho que o trouxe até esse momento, feito de uma mistura singular de criatividade e perseverança, Antonio Zelaquett Khoury destaca como acertada a opção de concentrar seus esforços no desenvolvimento de uma linha de pesquisa na UFF, em lugar de priorizar colaborações externas, e em meio à necessidade crescente de dar forma às suas próprias ideias. “Sempre quis desenvolver um tema que fosse identificado com a nossa instituição. Eu brincava com os colegas e alunos da Universidade dizendo que eu preferia dirigir o nosso fusquinha a andar de carona na Mercedes dos outros”, conclui.

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