Projeto da UFF incentiva a participação feminina na área da Matemática

Pesquisadoras da UFF participam do Encontro Mundial de Mulheres em Matemática (WM)2

Crédito da fotografia: 
Divulgação

Desmistificar a figura estereotipada do cientista como um homem branco e de certa idade pode não ser tarefa fácil, mas isso não desanima as professoras Cecília de Souza Fernandez e Ana Maria Luz Fassarella, do Instituto de Matemática e Estatística da UFF (IME). Com o objetivo de atrair jovens alunas para a carreira da Matemática e promover a divulgação de trabalhos científicos de alto nível realizados por profissionais brasileiras da área, as pesquisadoras criaram em 2016 o projeto de extensão Mulheres na Matemática. A ação é uma tentativa de criar modelos a serem seguidos por tantas meninas que, por falta de identificação com o estereótipo de pesquisador da área, se veem desestimuladas a seguir a carreira e outras afins, como Engenharia e Computação.

Segundo as pesquisadoras, os estereótipos de gênero são inúmeros em nossa sociedade,  como “mulher dirige mal”, “homem não chora”, “mulher não é boa em matemática”, entre outros. Seus efeitos passam pela criação e pelo enraizamento social de crenças que são reconhecidamente danosas para os grupos dominados. “Estudos sugerem que mulheres têm a concepção de que, de um modo geral, são consideradas incapazes ou têm capacidade cognitiva reduzida para cálculos matemáticos, raciocínio lógico e orientação espacial. Mesmo que elas possam ter a noção da falsidade dessas afirmações, cumprem a “profecia” que a sociedade faz a seu respeito e, de fato, não conseguem bom desempenho nessas atividades”, explica Cecília.

Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), das mais de 6 milhões de pessoas que realizaram o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2017, aproximadamente 58% eram do sexo feminino. Apesar disso, em pesquisa sobre as áreas de exatas, as professoras mostram que o número de mulheres ainda é bastante reduzido, como se pode observar no gráfico abaixo, que mostra o perfil dos ingressantes na UFF em alguns cursos na última seleção.

Atualmente, o projeto Mulheres na Matemática também conta com a participação de cinco alunas, sendo três do curso de graduação em Matemática e duas da Ciência da Computação, além das professoras Cecília e Ana Maria. “A sobrecarga de trabalho das mulheres, que geralmente acumulam as tarefas do lar com a ciência, prejudica a produção das profissionais, numa área onde o trabalho de pesquisa é muito árduo. A mudança precisa ser compartilhada por homens e mulheres e começa pelos mais jovens. Nesse semestre, iniciaremos um trabalho com alunas e alunos do nono ano do ensino fundamental e do primeiro ano do ensino médio”, relata Cecília.

Segundo a estudante do 6º período do bacharelado em Matemática de Volta Redonda, Beatriz Nascimento, além dos estereótipos, a forma como a matemática é ensinada na escola é, muitas vezes, bastante desencorajadora. “Só fui começar realmente a gostar de matemática na UFF, quando tive contato com bons professores e com as novidades da área”. A estudante também ressalta que a falta de representatividade na área é gritante. “São raras as referências bibliográficas escritas por mulheres, mas dá para ver que o cenário está mudando aos poucos e englobando mais e mais o público feminino, o que me deixa muito otimista com o futuro na profissão”. 

Já a mestranda Jacqueline Macharete explica que começou a ter mais afinidade com a matemática devido a uma professora do ensino médio no Liceu Nilo Peçanha, em Niterói. “D. Almerinda incentivava muito o raciocínio crítico e investigativo, muitas vezes com desafios que eram bastante motivadores. Isso fez com que eu me apaixonasse pela área”, lembra. Para ela, apesar de não existirem diferenças no aprendizado de homens e mulheres, a presença feminina ainda é minoria. “Quando cheguei à universidade, pude constatar que as turmas sempre tinham mais homens que mulheres e essa diferença aumentou bastante na pós-graduação. É uma carreira difícil para todos, mas se você tem um sonho tem que buscá-lo”, ressalta.

Na entrevista a seguir, as professoras Cecília e Ana Maria explicam um pouco mais sobre o projeto e suas carreiras.

Como se dá a atuação de vocês no projeto Mulheres na Matemática?
Ana Maria: Nosso site é o primeiro do Brasil a contar com entrevistas e biografias de matemáticas e divulga diversos eventos sobre a questão da representatividade de mulheres na Matemática e áreas afins, como Engenharia e Ciência da Computação. Nossa proposta é apresentar a carreira de grandes matemáticas com seus desafios e conquistas, divulgar dados estatísticos sobre a participação feminina na área da Matemática em diversas instituições de ensino e pesquisa no Brasil e no mundo, promover palestras para turmas do ensino médio de escolas públicas e particulares do estado do Rio de Janeiro, buscando atrair meninas para a Matemática, enfim, são muitas as frentes de atuação.

Vocês vêm recebendo apoio à iniciativa?
Cecília: Por seu ineditismo, nosso projeto foi divulgado pela Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), e esse reconhecimento foi dado também pelo maior centro de matemática da América Latina, o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa). Além disso, contamos com o apoio do nosso diretor, o professor Celso Costa, que esteve presente junto com o futuro reitor Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, no evento que eu e a professora Ana Maria organizamos: “A Matemática está em tudo. Em particular, na alma feminina!”. Esse evento abriu a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia de 2017 na UFF.

Como se dá o trabalho com o público do ensino médio?
Ana Maria: Nesse semestre, vamos começar a divulgar os trabalhos científicos de matemáticas para alunos e alunas do Colégio Universitário Geraldo Reis (Coluni). Aproveitamos para agradecer à diretora, professora Iduína Mont’Alverne Braun Chaves, pela parceria nesse projeto. Pretendemos expandir ainda mais nossas ações e, como já mencionamos, temos muito trabalho pela frente.

Na opinião de vocês, quais são as faces do machismo na ciência, em especial na Matemática?
Cecília: O preconceito começa pela exclusão. No último dia 15 de agosto, recebi um e-mail do Fórum de Pós-Graduação em Matemática, convocando a comunidade matemática brasileira para participar de um evento da área. Nenhuma mulher constava da lista de palestrantes, nem na comissão organizadora do evento.

Quais são os principais desafios quando se fala em igualdade de gênero na ciência?
Ana Maria: No que diz respeito a nossa capacidade intelectual e produção científica, parece que continuamos invisíveis aos olhos da sociedade, mas estamos conquistando nosso espaço aos poucos. Ainda existe muito a ser feito para tornarmos visível o trabalho das mulheres pesquisadoras. Cabe destacar iniciativas de sucesso, como a do Encontro Mundial de Mulheres em Matemática (WM)², que aconteceu em julho deste ano, no Rio de Janeiro. Na contramão do preconceito, o evento reuniu matemáticas de vários países do mundo e deu visibilidade ao trabalho científico de muitas mulheres.

Quais são as expectativas para o projeto?
Ana Maria: A médio prazo, esperamos aumentar a procura das meninas pelas carreiras na área de Exatas. Elas não procuram os cursos ou quando procuram o rendimento não é bom. E quantas dessas meninas realmente entraram nos cursos para os quais foram aprovadas e quantas conseguirão finalizar? São muitas as perguntas que devem ser respondidas para buscarmos um melhor entendimento dessa temática. Por isso, há muito trabalho a ser feito e precisamos de um coletivo de professoras e alunas da UFF, para juntas, tentarmos buscar respostas para essas perguntas e implementar ações para aumentar a “autoestima matemática” de jovens alunas de escolas públicas e privadas, de Niterói e de municípios vizinhos.

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