Pesquisa da UFF alerta para a existência de superbactérias nas praias de Niterói

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Cerca de 750 mil pessoas no mundo morrem por ano de infecções causadas por esses microrganismos

Niterói é uma cidade aberta ao mar, com praias oceânicas e de baía, que formam um acervo ambiental e turístico de grande importância para o município. Para assegurar a saúde do espaço natural e dos visitantes, é necessário manter o cuidado com a preservação desses locais. Em vista disso, a atenção com a poluição dos mares, oceanos e praias passa a ser fundamental, como aponta a pesquisa da Universidade Federal Fluminense (UFF) “Orla limpa, orla viva - região costeira de Niterói: problemas e soluções”.

O projeto teve início em março de 2021, em parceria com a Prefeitura de Niterói e a Fundação Euclides da Cunha (FEC) através do Programa de Desenvolvimento de Projetos Aplicados (PDPA). O objetivo é a avaliação da qualidade da areia das praias de Icaraí, Itaipu, Piratininga e São Francisco, investigando a relação entre a ocorrência do poluente microplástico e de superbactérias, aquelas com genes de resistência para diferentes antibióticos e que podem causar infecções difíceis de tratar. Agora, pouco mais de um ano depois, o estudo apresenta resultados que comprovam a existência desses microrganismos nas partículas plásticas encontradas na areia dos locais avaliados.

“É uma satisfação muito grande ver o avanço deste projeto e os primeiros resultados. Resultados que certamente contribuirão para saúde pública, para ciência e que com uma visão estratégica poderão guiar políticas públicas. Temos mais uma vez que evidenciar o impacto positivo do PDPA no município de Niterói. Trata-se de um projeto de grande magnitude, em parceria com a Prefeitura, e que já se consolida em várias frentes, graças ao empenho do poder público e dos nossos pesquisadores”, celebra o reitor da UFF Antonio Claudio Lucas da Nóbrega.

Outro gene identificado em abundância na areia das praias é o de resistência à classe da Azitromicina. Esse antibiótico foi amplamente utilizado de forma preventiva durante a pandemia de COVID-19, mesmo em pacientes não hospitalizados e com sintomas leves da doença. A utilização deste medicamento pode ter favorecido a seleção de bactérias resistentes não somente nas praias de Niterói, mas em outros diversos ambientes e regiões - Henrique Fragoso

O coordenador da pesquisa, professor Abílio Soares, do Departamento de Biologia Marinha da UFF, explica que os microplásticos são partículas com até cinco milímetros de diâmetro, oriundas da degradação de objetos maiores, consideradas um dos principais poluentes ambientais atualmente. De acordo com o docente, uma vez nos oceanos, eles podem permanecer na água ou ser transportados para a costa, onde irão se concentrar nas areias.

“Estudos anteriores demonstram que o microplástico encontrado no oceano pode abrigar inúmeros microrganismos, transmissores de doenças ou não, que podem afetar de forma desequilibrada o ecossistema vivo da praia. Nesse projeto, em especial, as análises descobriram que o microplástico é vetor de uma variedade de bactérias com genes de alta resistência à antibióticos. A existência desse poluente é um risco à saúde dos banhistas”, salienta Abílio.

O professor Henrique Fragoso, vice-coordenador da pesquisa e também da Biologia Marinha da UFF, destaca que, nos resultados obtidos, foi encontrada uma grande quantidade de genes de resistência a antibióticos da classe Vancomicina nos microplásticos retirados das areias das praias. “Esse é um medicamento de uso apenas hospitalar que trata infecções causadas por quase todos os Staphylococcus e muitas cepas de Enterococcus. As Vancomicinas são utilizadas para tratar infecções graves, como pneumonia e endocardite”.

“Outro gene identificado em abundância na areia das praias é o de resistência à classe da Azitromicina. Esse antibiótico foi amplamente utilizado de forma preventiva durante a pandemia de COVID-19, mesmo em pacientes não hospitalizados e com sintomas leves da doença. A utilização deste medicamento pode ter favorecido a seleção de bactérias resistentes não somente nas praias de Niterói, mas em outros diversos ambientes e regiões”, alerta o vice-coordenador da pesquisa.

De acordo com Henrique, “atualmente, cerca de 750 mil pessoas morrem por ano no mundo de infecções por estas chamadas superbactérias, e estima-se que este número poderá chegar a 10 milhões até 2050. Caso isso se confirme, o cenário está aberto para o surgimento de uma nova pandemia. Para evitar este quadro, são necessárias ações para diminuir o surgimento de novas superbactérias, como, por exemplo, um controle mais rigoroso no uso de antibióticos”.

O projeto “Orla limpa, orla viva”, segundo seus coordenadores, pode ser de utilidade para guiar políticas públicas locais. Eles enfatizam a necessidade de ações relacionadas à saúde pública, e da realização de amplas campanhas educativas para conscientizar a população sobre os impactos ambientais relacionados ao acúmulo de lixo nas praias. “Os cidadãos do município podem colaborar evitando o descarte de sujeira no espaço natural. Já a gestão pode cooperar com o equilíbrio da natureza mantendo uma coleta de lixo cada vez mais eficiente”, acrescentam.

Por fim, para Abílio e Henrique, a parceria PDPA entre as três instituições, que possibilitou o desenvolvimento da pesquisa, faz com que a UFF, com toda sua expertise, possa ajudar com soluções para problemas reais da cidade de Niterói. “A percepção da Prefeitura Municipal de Niterói em exercer um papel importante no fomento à pesquisa, a fim de auxiliar os estudos dos problemas do município, é algo extraordinário, em especial num momento de escassez de recursos por parte de outros órgãos de fomento tradicionais. O repasse e o gerenciamento dos projetos é muito benéfico para as partes envolvidas, trazendo agilidade e transparência na aplicação dos recursos. Que esse tipo de colaboração continue por muito tempo e sirva de modelo para outras cidades do Brasil”, finalizam.

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