Atualidades UFF: Tecnologia deve nortear planos de reconstrução e de prevenção a desastres naturais no Rio Grande do Sul

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante sobrevoo em Canoas - RS

Crédito da fotografia: 
Ricardo Stuckert / PR / Agência Brasil
Com a ocorrência de eventos climáticos extremos, o uso de novas ferramentas se torna essencial para prever danos futuros

De acordo com o último boletim da Defesa Civil do Rio Grande do Sul (8), as fortes chuvas que atingem o estado afetaram mais de 1,4 milhão de pessoas. Os dados confirmam 95 mortos, 128 desaparecidos e 372 pessoas feridas. Enquanto os trabalhos de resgate ainda acontecem, um alerta de “Grande Perigo” emitido pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) indica a chegada de uma frente fria capaz de provocar aumento nas condições de novas chuvas e rajadas de vento que podem chegar a 100 km/h.

Com o agravamento da situação climática do planeta, é esperado que o território gaúcho sofra com ocorrências de tempestades ainda mais frequentes. No ano passado, um ciclone extratropical já havia causado estragos em toda a região. Apesar do monitoramento e das previsões meteorológicas, a tragédia evidenciou a falta de políticas públicas que preparem as cidades para eventos climáticos extremos.

Prever para reduzir danos

O tempo nesses casos é um fator determinante para reduzir os danos e salvar vidas. Por isso, é essencial o monitoramento constante e a eficiência no envio de alertas e informações aos cidadãos. Em Niterói, por exemplo, a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Defesa Civil do município criaram um sistema que usa a Inteligência Artificial (IA) para prever temporais.

“Usamos a IA para aprimorar as previsões pluviométricas. A partir do modelo WRF - sistema de previsão de tempo numérico -, as redes neurais (Inteligência Artificial) utilizam o histórico de chuvas e de previsões para aprender com os erros numéricos e melhorar, principalmente, a previsão de precipitação”, explica o meteorologista e professor do Departamento de Engenharia Agrícola e Ambiental da UFF (TER/UFF), Márcio Cataldi.

Modelo meteorológico monitora os riscos em tempo real - Foto: Divulgação/Lucas Benevides

O docente também destaca que esse modelo é aplicado em alguns centros europeus e pode ajudar na prevenção de danos causados por desastres climáticos em outras regiões do país. “É possível replicar sim o que foi feito neste sistema para outras regiões, visando melhorar as previsões de chuva. No entanto, o aprimoramento da previsão é ineficaz, se os governantes não forem capazes de tomar decisões com base nela. Temos de observar também a forma como esses dados e informações são utilizados”.

Previsão do modelo WRF - Foto: Márcio Cataldi

Plano de reconstrução deve preparar as cidades para futuros eventos extremos

O Governo Federal reconheceu o estado de calamidade pública no RS. Dos 497 municípios gaúchos, 414 foram afetados pelas chuvas e estão com serviços de água, energia, internet e telefonia prejudicados. O cenário da infraestrutura também é devastador com a interdição de estradas, pontes, aeroportos e outros equipamentos. Para reconstruir o estado, segundo o Governador Eduardo Leite, vai ser preciso um “Plano Marshall”, indicando a excepcionalidade da situação e a necessidade de recursos extraordinários do orçamento.

O reconhecimento do estado de calamidade pública facilita o repasse e a utilização de verbas públicas para as ações de recuperação necessárias. Segundo o Governo Federal, já foi liberado mais de R$1 bilhão em emendas parlamentares para atender o RS.

Segundo a professora do TER/UFF, Franciele Zanandrea, é de suma importância que o planejamento para recuperar o Rio Grande do Sul proponha soluções de longo prazo que promovam a sustentabilidade do projeto. “É necessário integrar medidas de redução de riscos de desastres no planejamento, para minimizar a vulnerabilidade a eventos extremos, principalmente em um cenário de emergência climática. Precisamos que os projetos de recuperação auxiliem na construção de comunidades resilientes aos desastres, com o fortalecimento da defesa civil e planos de contingência que definam ações e responsáveis pelo gerenciamento dos riscos de desastres”, avalia.

Nesse sentido, Zanandrea, que é doutora em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), aponta diretrizes que devem ser contempladas no plano de recuperação do estado. “As cidades precisam prezar pelo gerenciamento adequado das águas e dos resíduos, além de optar pelo uso de soluções baseadas na natureza com o intuito de minimizar os impactos negativos do crescimento urbano. Por isso é importante o investimento em infraestruturas verdes, transporte público e ciclovias, reduzindo a dependência de veículos motorizados e aumentando a resiliência às interrupções causadas por eventos climáticos extremos”.

A docente ainda destaca que a construção do planejamento de recuperação é uma oportunidade de ouvir a população e estimular a participação coletiva. “Ações que possuem uma abordagem integrada e com participação social permitem que o foco não esteja apenas na recuperação física, mas também envolvam as dimensões sociais, econômicas, ambientais e culturais, atendendo as necessidades de diferentes grupos sociais”.

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante sobrevoo em Canoas - RS. Foto: Ricardo Stuckert / PR / Agência Brasil

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Márcio Cataldi é graduado em Meteorologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1999), com Mestrado em Engenharia Mecânica (2002) e Doutorado em engenharia Civil (2008) obtidos pela COPPE/UFRJ. Atualmente é Professor Associado III do Departamento de Engenharia Agrícola e do Meio Ambiente da UFF, Coordenador do Laboratório de Monitoramento e Modelagem do Sistema Climático - LAMMOC, Docente do Programa de Pós Graduação de Engenharia de Biossistemas (PGEB/UFF) e do programa de Pós Graduação em Engenharia Mecânica da UFF (PGMEC/UFF), Colaborador Externo do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Biotecnologia da Universidade Federal Fluminense (PPBI/UFF) e pesquisador visitante no Grupo de modelagem atmosférica regional - MAR GROUP da Universidade de Múrcia - ES. Tem experiência na área de modelagem atmosférica e climática, energia, sustentabilidade, previsão do tempo e clima, mudanças climáticas, clima e saúde, modelagem hidrológica, camada limite atmosférica, instrumentação de baixo custo e desastres naturais.

Franciele Zanandrea é graduada em Engenharia Ambiental, mestre e doutora em Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental. Desenvolve pesquisas na área de Recursos Hídricos, principalmente nos seguintes temas: hidrologia, hidrossedimentologia, conectividade, desastres naturais, hidrogeomorfologia, instrumentos de gestão de recursos hídricos e drenagem urbana. Atuou como analista ambiental na elaboração de diversos estudos ambientais. Participa dos grupos de pesquisas: GPDEN- Grupo de Pesquisas em Desastres Naturais e NESH- Núcleo de Estudos em Segurança Hídrica da UFRGS. Atualmente é Professora Adjunta do Departamento de Engenharia Agrícola e Meio Ambiente da Escola de Engenharia da Universidade Federal Fluminense, participando do Laboratório de Monitoramento e Modelagem de Sistemas Climáticos (LAMMOC). Atual diretora da Associação Brasileira de Recursos Hídricos (ABRHidro) e integrante da Comissão Técnica de Desastres da ABRHidro.

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