Pesquisadores da UFF debatem em Londres o papel das novas mídias na política latino-americana

Objetivo do evento é debater como os avanços na área tecnológica se relacionam com a manutenção das democracias na América Latina.

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Nas últimas eleições brasileiras, as redes sociais tiveram participação determinante na hora de o eleitor escolher os candidatos de sua preferência. As campanhas eleitorais foram alavancadas pela internet, através de redes sociais e aplicativos de mensagem instantânea. Esse fenômeno, relacionado ao uso massivo das novas tecnologias nas eleições latino-americanas, vem sendo estudado por especialistas na área e será tema do Workshop “Mídia, novas tecnologias e desenvolvimento na América Latina: perspectivas políticas, sociais e econômicas”, que acontecerá nos próximos dias 4 e 5 de julho, na City, Universidade de Londres. O evento internacional será coordenado pelo professor do curso de Comunicação Social, Publicidade e Propaganda da UFF, Adilson Cabral, em parceria com a UERJ e financiamento de uma agência de fomento britânica.

“O objetivo é debater os avanços na área tecnológica e sua influência no desenvolvimento sul-americano e na manutenção das democracias nesses países, em plena era de concentração e comercialização midiática”, explica a professora de Mídia e Sociologia do Departamento de Sociologia da universidade londrina e conferencista sênior da segunda etapa do workshop, Carolina Matos. Segundo ela, a etapa londrina antecipará o que será debatido no IAMCR 2019 (International Association in Media and Communication Research), que será realizado na Espanha ainda esse mês.

“As “fake news” são o produto mais perverso dessa organização, na medida em que são amplamente acionadas e acolhidas, ganhando o status de verdade”, Adilson Cabral.

O assunto já foi debatido em março no Instituto de Artes e Comunicação Social (Iacs) da UFF, onde foi realizada a primeira etapa do Workshop. “Esses encontros intensificam a colaboração entre os países latino-americanos e a Europa, num momento no qual se discute a importância da “de-colonização” - influência ou transferência cultural dos colonizadores para os colonizados e vice-versa - dos estudos e do ensino no Reino Unido no ambiente acadêmico”, explica Carolina.

“A Universidade Federal Fluminense tem enorme tradição em pesquisas e produtos relacionados à Comunicação Comunitária e o workshop realizado aqui foi uma excelente oportunidade para aproximar os laços com a produção latino-americana e britânica”, adiantou Cabral. Já na opinião de Carolina, o evento foi importante para todas as instituições acadêmicas brasileiras com as quais a City trabalha conjuntamente. “Além da UFF, foram estabelecidas parcerias como o Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da UERJ, onde sou professora visitante, atuando em um projeto sobre o uso da comunicação e das redes digitais por ONGs que trabalham com a igualdade de gênero e direitos sexuais e reprodutivos”, destaca.


A etapa londrina

Em uma época de crescente concentração e comercialização da mídia, como podemos analisar o papel dos meios de comunicação para a democracia? Como a comunicação em rede pode ser melhor utilizada para dar voz não só à sociedade civil, mas também a movimentos sociais e grupos marginalizados socialmente? Como podem as tecnologias de informação e comunicação (TICs) ser utilizadas para o desenvolvimento das nações? Estas são algumas das muitas questões que foram discutidas recentemente na etapa brasileira do workshop, realizado no Iacs, e que serão aprofundadas na etapa londrina do evento, que contará com palestras proferidas por pesquisadores latino-americanos, norte-americanos e europeus especialistas na área de mídia.

Um dos principais focos dos organizadores é dar visibilidade ao papel das comunicações e das novas tecnologias (TICs), inclusive das rádios comunitárias e TVs universitárias, no desenvolvimento das mais diversas comunidades. “O trabalho se estende às populações indígenas, movimentos sociais, a relação entre participação, empoderamento e gênero, e particularmente em relação ao uso das mídias e como essas ferramentas de comunicação podem ser usadas para o ativismo e o engajamento político”, enfatiza Adilson.

Na entrevista a seguir, o professor Adilson Cabral explica alguns aspectos do debate sobre o uso eleitoral das redes sociais na América Latina:

As eleições americanas e brasileiras comprovaram o poder das redes sociais na escolha e definição de um candidato. Como o senhor avalia esse fenômeno?

Minha compreensão é que as mídias sociais e, especialmente, os mensageiros instantâneos, estão sendo usados a partir da mineração de dados e da computação em nuvem para acionar uma extensa e imbricada rede de fabricação de verdades a partir de organizações que estão incidindo fortemente em cenários políticos ao redor do mundo.

As mídias sociais digitais comprovadamente foram decisivas nas últimas eleições aqui no Brasil e no exterior?

As redes sociais estão tomando uma importância maior e mais grave nas eleições por conta dos agenciamentos em torno das tecnologias para mobilizar o acionamento de conteúdos em escala massiva, para usuários geolocalizados. Trata-se de um projeto mundialmente orquestrado, que está sendo acionado em vários países, incluindo a América Latina, e que demanda atenção fundamental da sociedade e regulação transparente e de alcance internacional por parte das nações.

Como funcionam as “fake news” dentro desse contexto?

As “fake news” são o produto mais perverso dessa organização, na medida em que são amplamente acionadas e acolhidas, ganhando o status de verdade diante de um amplo deserto de ideias e da inviabilidade do Estado do bem estar na formulação e implementação de políticas públicas capazes de promover direitos humanos relacionados à supressão da desigualdade de renda.

Como especialista em Comunicação Comunitária, como o senhor destaca a força e a penetração das rádios comunitárias? Elas também foram determinantes nas últimas eleições no Brasil?

As rádios efetivamente comunitárias estão sendo restringidas em seu potencial de atuação, justo por serem o contraponto dessa articulação, em virtude de sua transparência e da participação plural com a diversidade cultural. E vale destacar que elas, aliadas às TVs comunitárias, são veículos que não podem ser deixados de lado em virtude das tecnologias digitais, pois articulam comunidades em seus territórios e seus cotidianos. Esses veículos, apesar dos avanços tecnológicos e da concorrência das novas mídias, ainda permanecem no gosto de boa parte da população, com grande e importante penetração principalmente junto às comunidades mais pobres. E, sabendo disso, os candidatos se utilizam do meio para a divulgação de suas plataformas de governo.

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